Autor do artigo: Mário Picoto Pereira, Engenheiro da Produção Animal
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Nos dias em que vivemos, o conhecimento local poderá ser a resposta mais sustentável dos problemas que a sociedade atravessa, aliado à produção local.
Assistimos a um abandono notório da população jovem do território interior, muitas vezes de difícil acesso, abandonado, só, mas com vezes sem conta de oportunidades.
Os problemas rurais dificilmente serão resolvidos a partir de um ponto de vista económico ou técnico, uma vez que surgem como consequência de uma série de interações entre seres humanos e entre os mesmos com o ambiente.
Ao criarmos um modelo de desenvolvimento de produção animal local temos de considerar os aspetos biológicos, sociais, culturais, económicos, políticos e sistemas produtivos. Neste modelo devemos dar importância à organização, cooperação e inclusão de segmentos sociais tradicionais como as mulheres, os jovens e, imprescindivelmente, os idosos. Este conceito baseia-se em objetivos e critérios de seleção animal de acordo com as necessidades das comunidades locais. A base de criação animal nestes sistemas é em áreas desfavorecidas, onde só é possível produzir animais adaptados. Para a realização deste modelo devem ser destacados dois eixos “chave”, em que o primeiro envolve o conhecimento científico e o outro o conhecimento local.
Ao valorizarmos as características tradicionais, isto é, sócio-culturais e ambientais (meio) bem como a exploração de outros fatores da cadeia produtiva, podemos agregar mais valor (na transformação dos produtos primários e comercialização (mercados locais)), criação de marcas individuais e unificação do mercado (cooperação), criando uma relação entre pessoas rurais e urbanas, produtores e consumidores.
A Etnozootecnia tem sido utilizada de duas formas:
O funcionamento da produção animal local ou, por outras palavras, a etnozootecnia deve identificar dois pontos importantes:
- Identificação, caracterização e utilização de animais de raças autóctones;
- Analisar o saber local e o meio.
No primeiro ponto, as raças autóctones são estabelecidas a partir de ações e critérios humanos, como tal as informações que cada raça guarda não são apenas genéticas mas também históricas, pelos hábitos e crenças das sociedades que as criam e utilizam no trabalho.
Portugal é um país que, apesar do seu diminuto tamanho em comparação a outros mais, é rico em biodiversidade genética, toda ela pertencente a uma história de milhares de anos. Estamos a falar de raças adaptadas ao clima extremo, relevo, à procura de alimento natural por longas distâncias, a períodos de escassez de alimento (mobilizando reservas acumuladas no corpo em períodos de maior abundância alimentar), a doenças e parasitas.
No segundo ponto, ao analisar o saber local, estamos a falar na troca de conhecimentos entre os intervenientes diretos do meio, sejam criadores, pastores, etc.
Figura 1 Estrutura do conhecimento local/ Etnozootecnia.
Estratégia da produção local de animais
Trinómio Homem-Animal-Meio
Na estratégia de funcionamento da produção local, deve-se analisar os intervenientes do presente ciclo: Homem-Animal-Meio.
A participação dos criadores é muito importante, pois contribui para fortalecer as comunidades locais. O conhecimento zootécnico local é acumulado ao longo de muitas gerações e muitas vezes transmitido apenas pela comunicação oral, podendo ser visto como uma importante fonte de rendimento, formulando estratégias sociais de produção animal. O apoio a este conhecimento pode contribuir para o aumento do poder económico e, assim, melhorar as condições de vida do interior.
O conhecimento local contribui para a valorização de uma comunidade, estando relacionado com a agricultura, pecuária, produção de alimentos, educação, gestão de entidades de produção local, gestão de recursos naturais, saúde e cooperação.
Podemos concluir que:
Devemos olhar a produção local como um foco de rendimento, imprescindível para colmatar a vida económica e social do interior.
Cabe a todos que façamos esforços para ajudar a fundir o conhecimento científico com o conhecimento local.
É certo que, o conhecimento dos criadores locais acumulado ao longo de várias gerações, pode contribuir como uma fonte importante de fixação de gerações mais jovens, através do estímulo gerado para a criação de pequenas empresas e, assim, do próprio emprego por parte dos mesmos.
Este estímulo pode ser visto como uma estratégia socialmente apropriada para a conservação da biodiversidade doméstica, aumentando e ligando diferentes faixas etárias (jovens e idosos), imprescindível para unificar todos os intervenientes de um meio, evitando o isolamento e abandono social, agregando valor.
Tenho a certeza que, ao encurtarmos a cadeia de distribuição de forma inovadora, conseguiremos aproximar o produtor do consumidor final (com as novas tecnologias) e com o aumento da produção a nível concelhio, teremos a oportunidade de gerar uma marca de cooperação rentável e eficaz.