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Sabe o que são masseiras? Aprenda mais sobre este assunto

Autora do artigo: Mafalda Reis Pereira, Engenheira Agrónoma

Sabe o que são as masseiras?

 Contexto regional: sistema de produção das masseiras

O sistema de produção das masseiras surgiu nas regiões de Póvoa de Varzim, Apúlia, Fão e Rio Cávado. O clima destas regiões é tipicamente ameno, húmido, mesotérmico com escassez de água no inverno e reduzida concentração de eficiência térmica. A temperatura anual média ronda os 13.5ºC a 14ºC e as regiões encontram-se livres de geadas durante sensivelmente sete meses. A precipitação média anual é de 1000 a 1450 mm e o vento vem do norte com uma velocidade média de 12.4 km/h (estes são os denominados de “ventos de nortada”). Relativamente aos solos são na generalidade arenosos (arenossolos háplicos) que garantem um balanço térmico que favorece a aptidão para a cultura de hortícolas, sendo esta ainda favorecida pela proximidade de mercados e boa rede viária.

Esta região possuí um lençol freático a pequena profundidade que, mesmo muito próximo do mar, não acarreta problemas para as culturas derivados da salinidade.

masseiras povoa de varzim

Fonte da imagem: ICNF

Sistema de Produção hortícola e contexto histórico

Os sistemas de produção desta região dividem-se essencialmente em duas modalidades: sistema tradicional e empresarial.

A horticultura tradicional é efetuada em “campos masseiras”1. Estes agro-sistemas eram implantados nas dunas secundárias, no Noroeste Litoral de Portugal.

Ocupavam uma faixa litoral que se estende cerca de 6 a 10 km. Têm uma forma predominantemente retangular (o que facilita a drenagem superficial) e com um ligeiro declive para drenagem, sendo a sua dimensão aproximada de 1000 a 10000  e têm uma profundidade de aproximadamente 3 m (tendo sido rebaixados artificialmente por escavação).

As laterais do campo são designadas de moios, valos ou valados. Estes campos possuem estruturas para rega e drenagem (sistema de sangramento) que atenuam os efeitos desfavoráveis para as culturas inerentes à subida do lençol freático.

 

masseiras povoa de varzim

O rebaixamento é efetuado para que o campo fique mais próximo do nível freático o que é benéfico para a cultura pois permite que as plantas tenham acesso à água que necessitam para o seu desenvolvimento. Para além disso, protege as culturas dos ventos marítimos carregados de areia e sal, diminuindo assim o risco de acama da cultura e a deposição de sais sobre esta, assim como, diminui o efeito abrasivo da areia.

Facilita a evaporação de água que provoca um efeito de estufa favorável ao desenvolvimento da cultura pois torna a amplitude térmica menor. Como resultado, a temperatura na proximidade do lençol freático é maior, aumenta a evaporação e a humidade aérea da masseira.

Os moios das masseiras são estabilizados pelo cultivo de Vitis vinífera (vinha, que apresenta rápido desenvolvimento) que é ainda utilizada na produção de vinho. São geralmente utilizadas castas brancas e a vinha não é enxertada (pé franco).

masseiras povoa de varzim

Fonte da imagem:YouTube

O facto de o solo possuir salinidade e ser arenoso não permite o desenvolvimento da filoxera (praga da vinha), visto que esta não consegue escavar túneis e portanto concluir o seu ciclo de vida.

A areia da masseira transmite mal o calor, que fica retido sobretudo à superfície, podendo atingir os 80ºC no Verão. Deste modo, a vinha não devia tocar no solo (caso contrário, a produção era reduzida e os seus frutos eram apenas utilizados como uvas de mesa) pelo que houve a necessidade de se implementar um sistema de torniquetes – ao esticar o torniquete impede-se que a videira toque no solo. Este sistema (também designado levantamento sobre estacas) permitia que a produção aumentasse em quantidade e qualidade.

Era ainda utilizado um contrapeso – pedra de tamanho considerável enterrada para levantar o arame que suporta a vinha.

masseiras povoa de varzim

Fonte da imagem: pedestrianismo e património

Nas masseiras era comum efetuar-se as seguintes rotações que se apresentam no quadro seguinte:

Batata Batata Cenoura
Batata Cebola Cenoura
Batata Batata Couve penca
Cebola Cenoura Couve penca

Fertilização feita nas masseiras

A fertilização era feita com recurso a sargaço e pílado.

A sua apanha e recolha foi muito importante para aumentar a fertilidade dos solos arenosos. O pilado (Polybius henslowi) trata-se de um caranguejo rico em cálcio e magnésio, que combate os nemátodes. O seu alto teor em cálcio possibilita ainda uma melhor agregação dos pedes do solo. Este sistema de fertilização já era utilizado muito antes do nascimento deste sistema de produção, mas os materiais eram transportados apenas para terrenos próximos.

No passado, com o aparecimento do foral, a apanha do sargaço foi dada exclusivamente aos agricultores que trabalhavam nas masseiras. Também a Igreja impôs ordens, impedindo a apanha aos domingos e feriados. E mais recentemente foram impostas regras para que se gerisse a sua apanha, pois era um recurso escasso e passou apenas a ser permitida a sua apanha em épocas específicas.

masseiras povoa de varzim

Fonte da imagem:pedestrianismo e património

No sargaço as principais espécies utilizadas são Sacchoriza polyschides e Laminaria hyperborea. Estas contêm alginatos, o que permite aumentar a retenção de nutrientes e água (uma vez que permite a subida da água por capilaridade). Este composto é colocado sempre no inverno, com o intuito das chuvas dissolverem e lixiviarem o sal. Assim, esta incorporação permitiu transformar solos arenosos (não propícios à agricultura) em terrenos agrícolas.

Atualmente as masseiras enfrentam uma série de problemas devido à substituição dos fertilizantes naturais por fertilizantes de síntese, devido à venda de areias dos moios (utilizadas sobretudo na construção civil) e devido à implantação de estufas.

campos de masseiras

Fonte da imagem:cm-pvarzim.pt

A destruição dos moios tornou as masseiras maiores mas estas não apresentam tanta proteção conta os ventos. Os taludes foram substituídos por muros de tijolo e a paisagem foi, consequentemente, degradada.

A implementação de estufas nestes locais levou ao aparecimento de um microclima desfavorável devido à elevada humidade no seu interior, ao deficiente arejamento e ao aparecimento de pragas e doenças.

O lençol freático sofreu contaminação devido à substituição de corretivos orgânicos naturais por fertilizantes de síntese.

Acrescenta-se ainda que as masseiras têm vindo a ser substituídas por questões económicas, pois apenas fornecem rendimentos para autoconsumo.

 

Bibliografia:
1Ferreira, M. 1999. Processos dinâmicos em agroecossistemas dunares. Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Portugal. 85pp.
2Sampaio, A. 2013. Território das Masseiras: Interpretar e intervir na paisagem considerando as múltiplas expressões do tempo. Universidade do Minho, Portugal. 98pp.
3Pereira, C. 2003. Requalificação das masseiras (agricultura tradicional). Instituto de conservação da natureza. Esposende, Portugal. 24pp.

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