Como ter uma produção agrícola autossuficiente: o que ter em conta

A ideia de ter uma produção agrícola autossuficiente, onde  cultiva a sua própria comida e cria animais, é cada vez mais atrativa, especialmente com o aumento dos preços dos alimentos e a crescente preocupação com a sustentabilidade. Com apenas meio hectare de terra, é possível produzir grande parte dos alimentos necessários para abastecer uma casa. Este artigo detalhado explora como planear, implementar e manter uma “quinta” autossuficiente, abordando desde a criação de animais até o cultivo de alimentos e a gestão de recursos. 

Como ter uma produção agrícola autossuficiente

1. Avaliação Inicial: Planeamento da Quinta

1.1. Escolha e Avaliação do Local

A escolha do local é fundamental para o sucesso de uma quinta autossuficiente. Em Portugal, a localização ideal deve considerar o clima local, a topografia do terreno e a proximidade de recursos hídricos. Solos férteis são essenciais, por isso, antes de iniciar qualquer plantação, deve-se realizar uma  análise ao solo para determinar a sua composição, pH, e necessidades de correção. Solos argilosos e calcários são comuns em Portugal, e cada um requer diferentes abordagens de gestão.

Por exemplo, se a quinta/espaço disponível estiver localizada no Alentejo, onde o clima é mais quente e seco, deve-se optar por cultivares que resistam a estas condições, como a oliveira, o sobreiro e cereais. Em regiões mais húmidas, como o Minho, culturas como a vinha, o milho e hortícolas podem ser mais apropriadas.

1.2. Design da Quinta

Um bom design é vital para maximizar a eficiência do espaço disponível. Em Portugal, é comum dividir a quinta em várias áreas funcionais: hortas, pomares, áreas de pastagem e zonas de floresta. O uso de princípios da permacultura pode ser vantajoso, organizando a quinta em zonas com base na frequência de uso e nas necessidades de maneio.

Por exemplo, uma zona próxima à casa pode ser dedicada à horta e ao galinheiro, onde é necessário ir diariamente. Zonas mais afastadas podem ser reservadas para árvores de fruto e áreas de pastagem, que requerem menos visitas diárias.

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1.3. Sistema de Rotação de Culturas

A rotação de culturas é uma prática agrícola tradicional que ajuda a manter a fertilidade do solo e a controlar pragas e doenças. Num sistema de rotação de culturas em Portugal, é comum alternar entre leguminosas, cereais, hortícolas e plantas forrageiras, dependendo dos objetivos.

Por exemplo, num ciclo de quatro anos, pode-se plantar batatas no primeiro ano, seguidas de feijões no segundo, milho ou trigo no terceiro, e finalmente, um ano de pousio ou plantação de ervas de cobertura, como o trevo, para restaurar a fertilidade do solo. Este sistema é eficaz na gestão do solo e melhora a produtividade ao longo do tempo.

Consociar culturas também é umaa excelente prática a aplicar na sua área de produção.

Partilho abaixo uma videoaula minha sobre este tema:

2. Criação de Animais: Vacas Leiteiras, Porcos e Galinhas

2.1. Vaca Leiteira

A introdução de uma vaca leiteira ou mais numa produção autossuficiente em Portugal pode ser extremamente benéfica. A vaca fornece leite (depois de ser mãe), que pode ser utilizado na alimentação diária, na produção de queijos, manteiga e iogurtes. Além disso, o estrume da vaca é um excelente fertilizante para a horta e os campos. O vitelo pode ser criado com a mãe ou vendido a potenciais interessados.  Para continuar a produzir leite precisa de ser inseminada e ser mãe novamente ( este processo pode ser natural- se tiver macho próprio ou então um macho de outro agricultor ou inseminada artificialmente).

Por exemplo, na Beira Interior, onde as pequenas explorações leiteiras ainda são comuns, a raça Jersey é uma escolha popular devido à sua alta produção de leite e ao seu tamanho mais pequeno, que é mais manejável numa quinta de pequena escala. O leite pode ser consumido fresco ou transformado em produtos lácteos para venda ou troca com vizinhos.

Gestão da Vaca Leiteira

Para garantir a saúde e o bem-estar da vaca, é importante fornecer pasto de qualidade e complementar a sua alimentação com feno durante os meses de inverno. A gestão do pastoreio deve ser rotativa para evitar o sobrepastoreio, que pode degradar o solo. Em regiões como o Ribatejo, onde o clima não tem invernos tão agressivos, a vaca pode pastar ao ar livre durante grande parte do ano, enquanto nas regiões montanhosas, pode ser necessário abrigar os animais durante o inverno.

2.2. Criação de Porcos

A criação de porcos é uma prática tradicional em Portugal, especialmente no Alentejo, onde o porco preto alentejano é uma raça emblemática. Os porcos são animais robustos que podem ser criados ao ar livre, alimentando-se de bolotas, ervas e subprodutos da quinta.

Gestão e Alimentação dos Porcos

Os porcos podem ser criados em cercados móveis, permitindo que sejam rotacionados por diferentes áreas da quinta, onde podem ajudar a revolver o solo e fertilizá-lo com os seus dejetos. Esta prática não só melhora a fertilidade do solo, mas também proporciona um ambiente mais natural e saudável para os animais.

Por exemplo, um sistema de alimentação tradicional inclui bolotas, cereais como cevada e milho, e restos de cozinha. No Norte de Portugal, é comum preparar o porco para a matança anual, onde toda a carne é utilizada, incluindo para a produção de enchidos como chouriços e presuntos.

2.3. Criação de Galinhas

As galinhas são uma excelente adição a uma quinta autossuficiente, fornecendo ovos frescos e carne. Em Portugal, é comum ver galinhas a viverem soltas em quintas, o que lhes permite caçar insetos e fertilizar o solo naturalmente.

Gestão do Galinheiro

Um galinheiro móvel, que pode ser deslocado para diferentes áreas da quinta, é ideal para permitir que as galinhas fertilizem o solo de forma uniforme. Durante o inverno, é importante garantir que as galinhas tenham abrigo adequado contra o frio e a humidade, especialmente nas regiões mais chuvosas como o Minho.

Além disso, o uso de raças tradicionais portuguesas, como a Pedrês Portuguesa, pode ser vantajoso, pois são bem adaptadas ao clima local e produzem ovos de alta qualidade.

3. Cultivo de Alimentos: Estruturação da Horta

3.1. Divisão do Terreno para Cultivo

A parte dedicada ao cultivo deve ser organizada de forma a maximizar a produtividade. Em Portugal, é comum dedicar áreas específicas para diferentes tipos de culturas, como batatas, legumes e hortícolas. O método de consociação de culturas pode ser especialmente útil; por exemplo, plantar cebolas ao lado de cenouras pode ajudar a repelir pragas que afetam ambas as culturas (ex: mosca da cenoura).

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Exemplos Práticos de Culturas

  • Batata: Uma cultura bastante cultivada em Portugal, a batata pode ser plantada em praticamente todas as regiões, mas é especialmente produtiva em solos bem drenados e ricos em matéria orgânica.
  • Couve-galega: Essencial na alimentação portuguesa, especialmente no caldo verde, a couve-galega é uma planta resistente que pode ser cultivada durante o inverno.
  • Tomate: No Sul de Portugal, o tomate é uma cultura de verão que requer sol abundante e um solo bem drenado.
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3.2. Métodos de Cultivo Sustentável e autossuficiente

Adotar práticas de cultivo sustentável é essencial para manter a produtividade a longo prazo. Em Portugal, o uso de compostagemé uma prática comum para enriquecer o solo. Compostar restos de cozinha, folhas e estrume animal cria um fertilizante natural rico em nutrientes.

Outro método eficaz é o uso de coberturas de solo (mulching) para conservar a humidade, suprimir ervas daninhas e melhorar a estrutura do solo. Por exemplo, na região do Alentejo, onde o verão é seco e quente, a cobertura do solo com palha ou folhas secas pode ser particularmente útil para conservar a humidade e proteger as plantas do calor extremo.

3.3. Irrigação Eficiente

Em muitas regiões de Portugal, especialmente no Alentejo e Algarve, a gestão da água é crucial devido à escassez. Implementar sistemas de rega gota a gota é uma das maneiras mais eficientes de usar a água, garantindo que as plantas recebem a quantidade necessária sem desperdício.

Sistemas de Captação de Água da Chuva

Outro aspecto importante é a captação de água da chuva. Cisternas e tanques podem ser instalados para recolher a água da chuva dos telhados, que depois pode ser usada para irrigar a horta durante os períodos secos. Este sistema não só reduz a dependência de água da rede pública, como também promove uma abordagem mais sustentável e económica à gestão da água.

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4. Gestão de Resíduos e Reciclagem de Nutrientes

4.1. Compostagem e Vermicompostagem

A compostagem é uma prática fundamental em qualquer quinta autossuficiente. Em Portugal, é comum compostar restos de cozinha, podas de árvores e ervas daninhas para criar um composto rico que pode ser aplicado diretamente nas culturas.

Práticas de Compostagem

Uma pilha de compostagem bem gerida deve ser equilibrada em termos de carbono e nitrogénio. Por exemplo, uma mistura de folhas secas (carbono) e restos de vegetais (azoto) é ideal. Revolver a pilha regularmente acelera o processo de decomposição, enquanto a adição de água (se necessário) mantém a humidade adequada.

A vermicompostagem, que utiliza minhocas para decompor a matéria orgânica, é outra prática eficaz, especialmente em quintas de menor escala. As minhocas ajudam a acelerar o processo de compostagem e produzem um fertilizante muito nutritivo, conhecido como húmus de minhoca.

4.2. Gestão de Resíduos Animais

Os resíduos dos animais, como estrume de vaca, porco ou galinha, são recursos valiosos. O estrume deve ser devidamente compostado antes de ser aplicado nas culturas, para evitar a contaminação por patógenos e para garantir que os nutrientes estejam disponíveis para as plantas.

Por exemplo, em quintas no Norte de Portugal, onde a criação de gado é comum, o estrume de vaca é frequentemente utilizado para fertilizar campos de milho e batata. Este estrume é geralmente acumulado durante o inverno e espalhado nos campos na primavera, após ser bem compostado.

5. Integração de Recursos Naturais e Tecnologias

5.1. Energia Renovável

A integração de fontes de energia renovável é uma excelente forma de tornar a quinta ainda mais autossuficiente. Em Portugal, o sol é uma fonte abundante de energia, especialmente no Sul, o que torna os painéis solares uma escolha popular.

Exemplos de Aplicações Práticas

  • Painéis solares: Podem ser usados para alimentar sistemas de rega, iluminação e até pequenos electrodomésticos na quinta.
  • Microturbinas eólicas: Em regiões ventosas, como as zonas costeiras, as microturbinas eólicas podem ser instaladas para gerar eletricidade.
  • Aquecimento solar de água: Um sistema de aquecimento solar pode ser utilizado para fornecer água quente para a casa e para a criação de animais.

5.2. Aproveitamento de Recursos Locais

O uso eficiente dos recursos locais não só reduz os custos, mas também promove a sustentabilidade. Em Portugal, é comum utilizar materiais disponíveis na quinta ou nas proximidades para construir infraestruturas e melhorar a produtividade.

Por exemplo, a madeira de podas pode ser utilizada para construir cercas, enquanto pedras retiradas do campo podem ser usadas para construir muros de contenção. A criação de pequenas barragens em ribeiros pode ajudar a armazenar água para rega.

A closeup of wild yellow flowers with blurry white windmills on the background under a cloudy sky

5.3. Tecnologias de Monitorização

O uso de tecnologias para monitorizar as condições da quinta pode otimizar as operações e melhorar a eficiência. Sensores de humidade do solo, temperatura e níveis de nutrientes podem ser instalados para fornecer dados em tempo real, permitindo ajustes rápidos e precisos nas práticas agrícolas.

Por exemplo, um sensor de humidade pode ajudar a evitar a rega excessiva, economizando água e protegendo as plantas de doenças fúngicas. O uso de drones para monitorizar o crescimento das culturas e identificar problemas de pragas ou doenças também está a ganhar popularidade em quintas mais avançadas tecnologicamente.

Notas finais

Espero que este artigo tenha sido útil para conseguir ter uma produção agrícola autossuficiente mais facilmente. Este também é o seu objetivo?

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Olá, sou a Rosa. Nasci e cresci em meio rural e desde cedo percebi o que queria fazer para o resto da vida. Mais tarde, quando entrei no ensino superior tornei-me Técnica Superior do Ambiente e Agrónoma, áreas que sempre me fascinaram. Este blog é mais do que um projecto pessoal...é  o culminar de duas paixões: a escrita e as ciências ambientais e agrárias. Este é um local de encontro entre todos aqueles que partilham destas mesmas paixões.  
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